quarta-feira, 25 de julho de 2007



(...Imagem lunar ou do Porto Santo!)

Do Sagrado Feminino
PAISAGEM
É um corpo de mulher,
a vista de montes
e vales de cinza.
Deserto que nos fala
da «Ilha dos Amores»
e da origem da nossa identidade.
Manuel Pessôa-Lopes
in BASE PXO - 2006

domingo, 22 de julho de 2007

PASSARAM POR MIM NO ROSSIO

Sábado passado os manifestantes da «frente nacional» cantavam A Portuguesa (o Hino de Portugal), de braço e mão estendidos fazendo a saudação fascista, junto da estátua daquele D. Pedro que fundou a soberania do Brasil e deu a Portugal o primeiro documento constitucional. Vieram do lado do Martim Moniz à Mouraria, que desde o tempo de D. Afonso Henriques é sitio de etnias diferentes. Alguns dos que se manifestavam contra os imigrantes traziam a Bandeira Portuguesa, verde e rubra em que sob o escudo português se vê o símbolo da ligação histórica entre o nosso povo e os demais deste planeta: a Esfera Armilar. Nunca vi serem tão insultados os símbolos de Portugal! Revoltei-me e senti vergonha. Ilucidei um casal idoso de turistas ingleses do que se passava, e o britânico cavalheiro disse-me apreensivo que havia lutado contra os nazis na II Guerra Mundial... Um agente da Polícia de Segurança Pública confessou também a sua vergonha e indignação, tentei sossegá-lo lembrando que nesse mesmo dia houve um jogo de futebol amigável entre a P.S.P. e imigrantes da Cova da Moura, bem haja a nossa Polícia e os imigrantes também! Houve um manifestante daqueles, já de cabelos brancos e não rapados como os de muitos que lá se viam, que me perguntou se eu custumava ir a banhos à praia de Carcavelos... respondi-lhe que lá vou sempre que quero, pois as praias de Portugal (assim como o Sol) são acessíveis a todos! Pessoas de bem e criminosos há-os de todas as nacionalidades e etnias, e informei-o um pouco do quanto, embora sendo eu caucassiano e de olhos azuis, existe de micegenação na minha familia lusa, afastou-se confundido para junto da pequena multidão que gritava: «Portugal é dos portugueses» e «fora com os imigrantes», não sei como pretendem que se passe à acção sugerida por esta propaganda, mas dado que são frases tão típicas da ideologia nazi, receio perceber que a solução consequente seja a mesma que o regime de Adolfo Hitler utilizou: aquela «solução final» que ninguém quer ver repetida... ou há quem queira? Onde estão a tolerância, a humanidade, o bom acolhimento, a ternura e os brandos costumes portugueses?
Os imigrantes devem ser vistos como pessoas que nos podem trazer benefícios: a cosmopolidade é enriquecedora da nossa cultura e civilização e necessária à nossa cultura e desenvolvimento. A política tem de ser de integração social e para absoluta legalização, sem nenhuma descriminação, exploração e humilhação. Há que agir começando por exemplo no Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que funciona em moldes do género dos mencionados na literatura de Franz Kafka, pois que é lá que se trata de todos e devidos processos de legalização, o que à porta deste serviço na Av. António Augusto de Aguiar, em Lisboa, aconteçe todos os dias é de calamidade pública: centenas de pessoas aguardam uma madrugada a fio, por uma das escassas cinquenta senhas que são distribuídas diáriamente, sem contar com as intermináveis horas, que os que conseguiram obter uma dessas senhas, têm que aguardar pelo atendimento, não falando ainda da «tortura» da papelada... sei-o bem, pois fiz-lhes companhia duas vezes na passada semana e é ver para crer, basta lá ir e não ignorar. Os funcionários dos Centro de Emprego e do Instituto de Emprego e de Formação Profissional também têm uma missão e responsabilidade a cumprir para com os imigrantes, comecem por conhecer as leis que regem a acessibilidade à inscrição nos Centros e ao emprego quando os imigrantes iniciam um processo de legalização. Que a burocracia não esmague o que é de direito.
Ilegalidade não, nem roubo, nem arrastão, nem tráfico de droga ou de pessoas, nem lenocínio e tudo o resto, a que interesses de determinados a imigração ilegal serve?
Senhores governantes há que agir! Xenofobia e racismo são crimes previstos na lei portuguesa e são contra o consagrado na Declaração Universal dos Direitos do Homem da qual Portugal é signatário.

Manuel Pessôa-Lopes
Lisboa, 19 de Junho de 2005

CARTAZ EXPOSIÇÃO «SOMBRA» (2003)




APRENDI A PINTAR COM A LUZ,
CONSTRUI UM ARMAZÉM DE MEMÓRIAS,
VIVO SOBRE PRATA.
IMOBILIZEI UM GESTO E GUARDEI UM PENSAMENTO...
TENHO UM SEGREDO:
CONSEGUI PARAR O TEMPO!

(Ich habe gelernt mit Licht zu malen,
ich habe ein Arsenal aus Erinnerungen aufgebaut,
lebndig durch Silber.
Ich habe eine Geste in Unbewegtheit gebannt und mich eines Gedankens angenommen...
ich habe ein Geheimnis:
ich habe geschafft die Zeit anzuhalten!)

Manuel Pessôa-Lopes

BERLIM - 1991
«Recortada a preto e branco com degradés de cinzento, nota suspensa da coreagrafia labiríntica que na vida cumprimos, exímios bailarinos do tempo, está ali a cristalização do gesto.
Na fotografia o gesto mágico roubado ao movimento.
Na aparente imobilidade do gesto o mistério. O convite. O desafio aos sentidos.
A súbita e electrizante descoberta. No gesto. Na ambiguidade do gesto.
É o jogo clandestino das formas aprisionadas, onde tudo vale e o gesto flui no engano das linhas fixas do tempo capturado. É o fascínio da fotografia.
Tudo o que se sente quando se olha finalmente para uma fotografia é propriedade absoluta dos nossos sentidos. O artista não partilha conosco o prazer delirante da descoberta. Ele já descobriu. Somos nós os cúmplices. Na engrenagem do jogo clandestino somos nós quem determina a linguagem da comunicação.
A fotografia é o acto de amor do fotógrafo. Ele dá-nos o espaço onde podem coabitar os nossos fantasmas e os que ele já lá deixou. Paralelamente. Sem nunca se tocarem. As sensações não se partilham. Acompanham-se muito de perto talvez, mas não se partilham.
O artista que fala com a objectiva. Quer, e muita vezes precisa, mostrar o gozo experimentado naquela imagem, observação lúcida do gesto que fazemos e não vemos. Ou a dor, o sorriso. A própria confusão dos fantasmas que nos são comuns. Há em toda a parte sinais que nos são familiares. O erotismo sentido que se percebe na explosão quente das formas que tocamos com os olhos. os vazios que procuramos evitar.
O artista é a nudez completa que nos fita com a verdade nos olhos. Expõe-se. É agora tremendamente frágil. Está consciente da sua vulnerabilidade e, contudo, exibe-se. Está lá. Faz a proposta.
Antes de tudo e acima de tudo há a coragem.É o ponto de partida. A coragem da proposta.
Nesta mostra, como em outras anteriores, Manuel Pessôa-Lopes aparece-nos como imaginário retalhista em armazém de memórias. Absolutamente só num mundo que o fascina e o confunde. Cruza o sorriso com um soluço contido .
É com dose de tremenda generosidade que nos descobre a gaveta mágica das imagens sem poder esconder a ânsia de nos sentir as emoções. De nos sentir perto dele. Daquilo que nele existe de (in)compartilhável.
Sente-se que tem uma nervosa necessidade de estar em cada fotografia, como um Peter Pan inquieto, atento ao nosso olhar, a dizer excitado, quando nota um particular brilho num particular olhar sobre um particular espaço/fotografia que... Há mais, tenho mais, tenho tudo... um tudo que ficou algures em sotãos de esquecimento e a frebe de uma mostra bloqueou a meticulosa escolha.
Não interessa se há ou não uma linguagem uniforme no discurso de Manuel Pessôa-Lopes. Deveria haver? Pesou mais a emoção na balança da escolha. Mas não excessivamente. O quanto baste para entender as nuances desse olhar rico de ternura. E lucidez. Dar. Dar é o mote. Abrir a pertubante galeria de espaços preenchidos por desilusões ainda atadas por um fio à ténue esperança de reaver o que porventura se tem como perdido.
O resto... o convite à participação... o gesto está lá. A proposta existe.»

António Manuel Esquível
1988